ANOS CONTURBADOS DE UMA ANGOLA EM MUDANÇA
IX Parte
A partir desse dia e durante o tempo que
Carlos estive em Calamboloca, a mulher foi sempre a lavadeira de Carlos, do
outro furriel e do alferes do pelotão de Carlos que também ainda não tinham
lavadeira.
Nesse período
a secção de Carlos fez protecção ao comboio que ia para Malange, sem nunca ter
sequer dado um tiro. Nunca houve qualquer contacto com o chamado inimigo,
apesar do comboio ir sempre à pinha e Carlos ter conhecimento de, de vez em
quando haver conflitos no mesmo.
Numa patrulha
apeada que o pelotão de Carlos fez pela zona, apenas encontrou no meio da mata
vestígios já antigos de pequenos acampamentos dos chamados turras, mas nada
recente.
Na realidade,
tudo indicava que em Dezembro de 1973, a guerra estava realmente ganha pelo
exército português no norte de Angola.
Quando
regressou à fazenda tentativa e se juntou á sua companhia, Carlos pensou que
iria ficar por ali até ao fim do seu tempo militar. Mas não. Pouco depois a
companhia recebe ordens para ir para o Sul. Destino Pereira D’Eça, junto à
fronteira com a Namíbia.
Nesta zona de
Angola, não havia guerra, a companhia de Carlos foi ali colocada como prevenção
contra a SWAPO.
SWAPO era o
movimento de libertação da Namíbia que, segundo informações dadas pelos
sul-africanos, apoiava a UNITA e esta apoiava a SWAPO. Assim Carlos fez várias
vezes patrulhas junto à fronteira sem nunca ter qualquer contacto quer com um,
quer com outro grupo de guerrilheiros.
É aqui, em Pedreira D ’Éça que
Carlos ouve a notícia de ter havido um golpe de Estado em Portugal, e que os
militares conhecidos como o grupo dos capitães, chefiados no terreno por
Salgueiro Maia, tinham tomado conta do poder e que Marcelo Caetano, primeiro
ministro de Portugal que tinha sucedido a Salazar, tinha fugido para o Brasil.
Dias depois,
os movimentos, que até aí, estavam completamente destroçados, reorganizaram-se
e começaram a entrar em Angola, sem qualquer intervenção militar portuguesa e,
começou a grande confusão.
Os movimentos
eram três, A FNLA de Holden Roberto; O MPLA de Agostinho Neto e a UNITA de
Jonas Savimbi. Todos queriam tomar conta dos quartéis portugueses e ficar com o
armamento português.
Havia ordens
do Alto-comissário de Portugal para Angola, o senhor Almirante Rosa Coutinho,
para não se oferecer resistência aos movimentos e que Portugal estava a
negociar a entrega pacífica das províncias aos respectivos movimentos.
Como em Angola
havia três movimentos, estava-se a preparar tudo para haver eleições
democráticas, controladas por Portugal.
Um dia,
aparece no quartel em
Pereira D ’Eça, uma delegação da UNITA, chefiada por um tal
Vaculucuta que foi falar com o capitão para fazerem uma mudança de poderes.
Carlos não sabe o que se passou, mas sabe o que o seu capitão fez e muito bem.
O capitão da
companhia de Carlos, não estava na disposição de entregar a sua companhia aos
movimentos de libertação.
Assim, mandou
reunir a companhia e em coluna militar segui para Sá-da-Bandeira, onde entregou
a companhia com todo o material e pessoal aos seus superiores do RI nº 22.
X
Parte
No dia seguinte
Carlos e todos os seus camaradas, passaram à disponibilidade, a guerra tinha
acabado. Julgavam eles. Mal sabiam que a verdadeira guerra iria começar.
Como angolano,
Carlos ficou alegre, foi para a sua Vila, onde tinha a noiva e concorreu a um
lugar de professor primário que havia em aberto na escola onde fez a primária.
O processo de
Carlos foi aceite pelo governo provisório de Luanda e assim que saiu a sua
colocação no Diário da Republica, Carlos começou a dar aulas em Vila Arriaga.
Carlos, assim
como a grande maioria dos Angolanos, pensavam que tudo iria ficar na mesma.
Angola apenas deixava de ser governada por portugueses e passava a ser
governada por angolanos. Carlos sentia-se português, pois nunca teve qualquer
outra nacionalidade e tinha sido tropa portuguesa, mas também era angolano por
nascença.
Pensava que
brancos, mulatos e negros, eram todos angolanos e Angola dava para todos. Por
isso, pensou continuar em Angola.
Durante o
primeiro ano, tudo correu dentro da normalidade. Carlos, foi leccionar a turma
da terceira classe. Eram no total 20 alunos. Carlos preparou os alunos para a
prova escrita de passagem para a 4ª classe.
No final do
ano, Carlos levou os alunos a exame e dezasseis passaram para a quarta classe.
Quatro não atingiram os objectivos.
Foi um
resultado bastante positivo, mas Carlos ficou triste pelos quatro alunos que
teriam de repetir o ano.
Carlos nunca
pensou em sair da sua terra e como tinha um emprego que pensava ser estável,
pois Angola necessitava de quadros, casou e formou a sua própria família.
A vida de
Carlos era de casa para a escola e da escola para casa, não se metia em
política, embora tivesse um fraco pela UNITA. Talvez por ser o movimento que se
encontrava mais perto da sua zona de residência, já que os do norte, pouco ou
nada lhe diziam.
Mas mesmo esse
fraquinho que sentia pela UNITA, Carlos nunca deixou transparecer, pois sabia
que tinha alunos cujos pais eram adeptos dos três movimentos e também alguns,
nomeadamente brancos, que como Carlos, se sentiam portugueses.
Um dia em que
o programa escolar mandava fazer um desenho da bandeira Nacional, Carlos viu
desenhos com todas as bandeiras: Portuguesa: Do MPLA; da FNLA e da UNITA. E a
todos deu a nota bom, sem fazer qualquer comentário.
O que Carlos
sentia pela UNITA, era apenas simpatia e nada mais. Os seus símbolos sempre
foram os portugueses desde que nascera e agora estava à espera que formassem
novos símbolos, que representasse a nova Angola. Seriam esses os seus novos
valores patrióticos, como Angolano que era de nascença, embora fosse português
de coração.
Muitos
portugueses abandonaram Angola em 1975, mas Carlos e sua família ficaram na
terra onde tinham nascido. Nunca tinham feito mal a ninguém e não conheciam o
chamado Portugal continental.
Na escola onde dava aulas à terceira classe,
havia o tão falado selo de povoamento de Marcelo Caetano, brancos, mulatos e
negros. Todos eram tratados por igual.
No segundo
ano, Carlos deveria dar aulas à quarta classe, mas não chegou a dar.
As eleições
não chegaram a ser feitas e o Alto-comissário de Portugal para Angola, O
tristemente conhecido Almirante Rosa Coutinho, o Almirante vermelho,
pertencente ao partido comunista Português, deu a independência ao MPLA, embora
a UNITA tivesse maior população.
Continua
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