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Tudo o que quero e não posso, tudo o que posso mas não devo, tudo o que devo mas receio. Queria mudar o Mundo, acabar com a fome, com a tristeza, com a maldade.Promover o bem, a harmonia, intensificar o AMOR. Tudo o que quero mas não posso. Romper com o passado porque ele existe, acabar com o medo porque ele existe, promover o futuro que é incerto.Dar vivas ao AMOR. A frustração de querer e não poder!...Quando tudo parece mostrar que é possível fazer voar o sonho!...Quando o sonho se torna pesadelo!...O melhor é tapar os olhos e não ver; fechar os ouvidos e não ouvir;impedir o pensamento de fluir. Enfim; ser sensato e cair na realidade da vida, mas ficar com a agradável consciência que o sonho poderia ser maravilhoso!...

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013



                             
                                    ANOS CONTURBADOS DE UMA ANGOLA EM MUDANÇA

                                                               XII Parte
Laica gostava muito de ovos estrelados. Sempre que os novos donos se sentassem à mesa para o pequeno-almoço, Laica ia para junto deles e também tinha o seu pires com um ovo estrelado no canto da sala, onde normalmente comia.
Quando Carlos saia para o trabalho, Laica ficava à porta de casa e ladrava até o novo dono desaparecer da sua vista. Só depois é que se ia deitar na sua caminha, que ficava aos pés da cama dos donos.
Um dia, no fim das aulas, um aluno negro ficou para o fim. Carlos durante todo o dia tinha reparado que o aluno não estava bem. Havia qualquer coisa que o preocupava. Perguntou o que ele tinha, mas o Pascoal, assim se chamava o aluno, respondeu que não tinha nada.
O Pascoal era um bom aluno. Muito inteligente. Estava mesmo acima da média. E por isso Carlos ficou ainda mais preocupado, mas disfarçou e fingiu que nada se estava a passar.
Enquanto Carlos arrumava a sala para o dia seguinte, e na sala só se encontravam ele e o Pascoal, o aluno aproximou-se de Carlos e falou:
- Senhor professor. Eu tenho uma coisa para lhe contar!
Carlos fez uma festa na cabeça do aluno e perguntou:
- Diz lá amigo o que queres?
Pascoal encheu-se de coragem e disse:
- Senhor professor, ontem à noite na minha sanzala, apareceram umas pessoas que eu não conheço e estiveram a falar com os homens. Eles queriam vir prender o senhor professor. O meu pai foi contra e disse que o professor é boa pessoa. É amigo dos negros. Mas os homens diziam:
-O professor foi tropa portuguesa e por isso tem que ir embora ou vai preso.
O meu pai disse que isso não é suficiente, pois o seu filho mais velho, o Mesquita, tinha ido para a tropa com o professor e eram muito amigos. Desde crianças.
E o Pascoal continuou:
- Ouvi os homens dizerem que não há brancos bons.
Carlos agradeceu ao seu aluno e disse:
-Não te preocupes Pascoal. Eu não fiz mal a ninguém e por isso não tenho nada a recear. Contudo muito obrigado por me avisares!
O aluno saiu e Carlos fechou a escola e foi para casa como sempre fazia.
A guerra civil entre os movimentos que tinha começado em Luanda, tinha-se expandido por toda Angola. Vila Arriaga, apesar de ser uma pequena vila, não foi excepção.
 Quem não tinha nada a temer, como Carlos e sua família, mantiveram-se calmos a trabalhar.
Escola acabou por fechar por ordem da directora; as repartições públicas tinham fechado todas. Só o comércio se mantinha aberto, vendendo à população, o que ainda havia para comer.
Angola não tinha governo. Mandava quem estivesse a controlar a zona. Umas vezes o MPLA, outras vezes a UNITA ou a FNLA.
Mas todos pareciam ser unânimes numa coisa: Angola era deles e tudo o que lá havia também.
Os comerciantes eram obrigados a fornecer comida gratuita aos militares. Se no o fizessem sofriam represálias.
Como a força militar mais numerosa em Vila Arriaga era a do FNLA, a casa comercial mais forte, neste caso a casa Lauro Almeida Gonçalves, pertença da sogra de Carlos, foi a nomeada para fornecer comida a este movimento.
Carlos, com a escola fechada, passava o tempo a trabalhar na casa comercial da sua sogra.
                                                          XIII Parte
 A sogra de Carlos, tinha uma casa bastante rica. Era um comércio misto que vendia de tudo. Desde medicamentos a livros escolares, passando pela mercearia, roupas, perfumes, etc. Havia também uma secção de brinquedos e uma de ferragens agrícolas. Era a única do género naquela vila e concelho.
A loja era abastecida por um armazém que a sogra de Carlos fazia questão de estar sempre repleto de mercadoria. Era hábito que já vinha do seu falecido pai, fundador da casa comercial.
Uma vez por mês iam a Sá-da-Bandeira comprar mercadorias para a loja. Mas ultimamente, Sá-da-Bandeira já não tinha mercadoria para vender e a sogra de Carlos resolveu ir a Moçâmedes fazer compras para a loja.
No regresso, com a carrinha carregada, à saída de Moçâmedes, foram mandados parar por um controlo dos militares do MPLA.
O militar do MPLA que tinha mandado parar a carrinha, estava a implicar, pois queria descarregar a carrinha ali mesmo. Nisto apareceu o Comandante e depois de uma conversa com a sogra de Carlos, que lhe explicou para onde ia a mercadoria, o comandante repreendeu o militar e disse:
- Então tu não vês que estes camaradas estão a levar comida para o povo da Bibala? Tem juízo e vai lá para dentro!
O militar retirou-se contrariado e a carrinha seguiu o seu destino.
Nessa altura, o MPLA estava a controlar as cidades e vilas do Sul de Angola, zona onde se encontrava Vila Arriaga.
A verdade se diga, o MPLA era a força que tinha os comandantes mais bem preparados e o verdadeiro selo de povoamento. Brancos, mulatos e negros. Nos outros movimentos, os militares eram todos negros. Só na parte política é que tinham mulatos e brancos,
Com a guerra civil, os movimentos abandonaram a Vila e só lá apareciam em patrulha.
Se o MPLA controlasse aquela zona, a patrulha era desse movimento.
Se fosse a UNITA a controlar a zona, a patrulha seria da UNITA e assim por diante.
Desde modo, a população tinha que ter cartões dos três movimentos para mostrar nos diversos controlos existentes, conforme a cor de quem estava a controlar a zona.
Era a luta pela sobrevivência.
Poucos dias depois, logo pela manhã cedo, apareceu na Vila uma carrinha com militares. Pararam em frente à casa comercial onde ficava também a residência de Carlos que tinha a porta aberta, como sempre fazia, logo que acordava.
Carlos sem nada a temer, estava à porta de casa a ver a movimentação e curioso para saber o que se estava a passar.
Os militares desceram da carinha, entraram para dentro da casa de Carlos empurrando-o e perguntaram por armas.
Gritavam todos os mesmo tempo:
- Onde tens as armas? Onde estão guardadas? Ao mesmo tempo que disparavam as suas armas em direcção ao tecto da casa, que ficou todo esburacado.
Revistaram a casa toda, partiram móveis, levantaram os colchões, reviraram tudo. Mas como era de esperar, não encontraram qualquer arma.
 Carlos apenas tinha tido em tempos uma caçadeira, mas essa arma já tinha sido entregue, precisamente ao comandante do MPLA, numa altura em que ele andou de casa em casa a desarmar toda a gente. Até as pressões de ar que a sogra de Carlos tinha para vender na casa comercial, levaram.
Continua

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