ANOS CONTURBADOS DE UMA ANGOLA EM MUDANÇA
VIII Parte
Pela rádio
Brazavil, ouvia-se que os dirigentes do MPLA e da FNLA com o apoio de outros
governantes africanos, estavam constantemente em reuniões com governos europeus
para resolveram o problema da presença portuguesa em África.
Todos os
países de África ocupados pelos europeus, já tinham a independência, menos os
territórios ocupados pelos portugueses.
Terminada a
campanha em Sanza Pombo ,
a companhia de Carlos foi para o Caxito e ficou colocada na Fazenda Tentativa.
A fazenda
Tentativa era uma fazenda agrícola que em tempos idos, cultivava entre outras
coisas, cana-de-açúcar e bananas. No seu tempo áureo, deveria ser uma grande
fazenda e muito importante na economia de Angola, pois até caminho-de-ferro
tinha. Estava desactivada, mas as bananeiras davam boa fruta.
Sempre que os
militares passassem pelo campo de bananeiras, apanhava cachos de bananas que
serviam para enriquecer a alimentação das tropas, composta principalmente por
ração de combate.
A tropa portuguesa sabia que os turras faziam
o mesmo, mas mesmo assim, nunca houve qualquer contacto entre eles.
Havia
suspeitas que os turras, por conhecer muito melhor o terreno que as tropas
portuguesas, controlavam a movimentação das tropas e evitavam assim o contacto
directo.
Isto era mais
uma amostra de que os chamados turras estavam em decadência militar.
Nesse período,
a companhia de Carlos também era uma das responsável pela segurança da Barragem
das Mabubas , onde havia um complexo industrial eléctrico que fornecia
electricidade a Luanda.
Carlos era o
furriel mais antigo da Companhia e por tal motivo, pertencia ao primeiro
pelotão, onde chefiava a primeira secção.
O pelotão de
Carlos foi destacado para Calamboloca,
Carlos não
sabia a importância que tinha aquela povoação. Mas quando lá chegou, soube que
era a terra do já lendário Comandante supremo do MPLA, o Dr. Agostinho Neto.
Isto por si só, já era motivo suficiente para se ter respeito, pois pensava-se
que na sua terra natal o líder teria mais apoios e a luta seria com certeza
mais activa.
Mas não. Da
tal luta armada apenas se ouvia falar, que em tempos passados aquela zona teria
sido terrível, mas hoje, com a psico utilizada pelo exército português, estava
uma zona normal.
Nas várias
patrulhas que a secção de Carlos fez naquela zona, sempre encontrou população
amiga e sempre pronta a ajudar.
Numa dessas
patrulhas, Carlos passou por uma sanzala que ficava perto do quartel. Aí, uma
mulher com uma criança ao colo, foi até Carlos e pediu se lhe podia dar algo
para comer.
Carlos não só
deu a sua ração de combate, como também perguntou se ela queria ser a sua
lavadeira.
A mulher
aceitou de imediato e no dia seguinte estava junto à vedação de arame farpado
do quartel à procura de Carlos.
Carlos foi ter
com ela e entregou-lhe apenas uma camisa e um par de calças civis e roupa
interior. Carlos tinha mais roupa suja, mas quis assim experimentar se a mulher
seria ou não de confiança.
Dois dias
depois a mulher aparece com a roupa lavada e passada. Carlos viu que estava
tudo em ordem e pagou à mulher o que ela pediu pelo trabalho.
IX Parte
A partir desse dia e durante o tempo que
Carlos estive em Calamboloca, a mulher foi sempre a lavadeira de Carlos, do
outro furriel e do alferes do pelotão de Carlos que também ainda não tinham
lavadeira.
Nesse período
a secção de Carlos fez protecção ao comboio que ia para Malange, sem nunca ter
sequer dado um tiro. Nunca houve qualquer contacto com o chamado inimigo,
apesar do comboio ir sempre à pinha e Carlos ter conhecimento de, de vez em
quando haver conflitos no mesmo.
Numa patrulha
apeada que o pelotão de Carlos fez pela zona, apenas encontrou no meio da mata
vestígios já antigos de pequenos acampamentos dos chamados turras, mas nada
recente.
Na realidade,
tudo indicava que em Dezembro de 1973, a guerra estava realmente ganha pelo
exército português no norte de Angola.
Quando
regressou à fazenda tentativa e se juntou á sua companhia, Carlos pensou que
iria ficar por ali até ao fim do seu tempo militar. Mas não. Pouco depois a
companhia recebe ordens para ir para o Sul. Destino Pereira D’Eça, junto à
fronteira com a Namíbia.
Nesta zona de
Angola, não havia guerra, a companhia de Carlos foi ali colocada como prevenção
contra a SWAPO.
SWAPO era o
movimento de libertação da Namíbia que, segundo informações dadas pelos
sul-africanos, apoiava a UNITA e esta apoiava a SWAPO. Assim Carlos fez várias
vezes patrulhas junto à fronteira sem nunca ter qualquer contacto quer com um,
quer com outro grupo de guerrilheiros.
É aqui, em Pedreira D ’Éça que
Carlos ouve a notícia de ter havido um golpe de Estado em Portugal, e que os
militares conhecidos como o grupo dos capitães, chefiados no terreno por
Salgueiro Maia, tinham tomado conta do poder e que Marcelo Caetano, primeiro
ministro de Portugal que tinha sucedido a Salazar, tinha fugido para o Brasil.
Dias depois,
os movimentos, que até aí, estavam completamente destroçados, reorganizaram-se
e começaram a entrar em Angola, sem qualquer intervenção militar portuguesa e,
começou a grande confusão.
Os movimentos
eram três, A FNLA de Holden Roberto; O MPLA de Agostinho Neto e a UNITA de
Jonas Savimbi. Todos queriam tomar conta dos quartéis portugueses e ficar com o
armamento português.
Havia ordens
do Alto-comissário de Portugal para Angola, o senhor Almirante Rosa Coutinho,
para não se oferecer resistência aos movimentos e que Portugal estava a
negociar a entrega pacífica das províncias aos respectivos movimentos.
Como em Angola
havia três movimentos, estava-se a preparar tudo para haver eleições democráticas,
controladas por Portugal.
Um dia,
aparece no quartel em
Pereira D ’Eça, uma delegação da UNITA, chefiada por um tal
Vaculucuta que foi falar com o capitão para fazerem uma mudança de poderes.
Carlos não sabe o que se passou, mas sabe o que o seu capitão fez e muito bem.
O capitão da
companhia de Carlos, não estava na disposição de entregar a sua companhia aos
movimentos de libertação.
Assim, mandou
reunir a companhia e em coluna militar segui para Sá-da-Bandeira, onde entregou
a companhia com todo o material e pessoal aos seus superiores do RI nº 22.
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